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MANIFESTO DE EDUCADORES DA REDE ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO EM DEFESA DA NOSSA AUTONOMIA PEDAGÓGICA

As orientações de Planejamento Pedagógico para Professores, divulgadas pela SEEDUC/RJ aos educadores nesse início de ano letivo de 2021, materializam uma concepção de ensino remoto que há muito vem sendo debatida nos espaços de construção de conhecimento sobre processos educacionais, tanto no ensino básico, quanto no superior. O ensino remoto, como ferramenta educacional, pode e deve ser utilizado em situações nas quais a interação presencial não se faz possível. No entanto, tal ferramenta deve estar em consonância com o processo de ensino-aprendizagem e não substituí-lo.

Esse processo consiste numa integração dialética, que tem por fim a formação multilateral dos sujeitos que dele participam. Deve ser também compreendido como um ato político, incrustado e relativo às relações de classe, raça, gênero e poder na produção e legitimação do significado e da experiência da vida cotidiana. Para que tal processo ocorra de forma satisfatória não é possível ignorar a relação entre conhecimento e poder, e por isso, todos os envolvidos no processo (professores, funcionários, equipe pedagógica e alunos) devem ter um papel de sujeitos do processo e da interação, através da tão falada, e nada respeitada, autonomia pedagógica.

Assim, consideramos urgente e necessária uma crítica ao Planejamento Pedagógico feito pela SEEDUC-RJ, como solução para os desafios de mais um ano letivo atravessado pelo contexto pandêmico. O ano de 2020 foi, apesar dos esforços da categoria, marcado pela exclusão educacional, pela evasão escolar e pelo esvaziamento de sentido pedagógico. Porém, temos, como humanos, uma capacidade de adaptação e solução de problemas extraordinária, e nós, como educadores, temos a tarefa e a capacidade de construir um projeto de alternativa pedagógica que dê conta das necessidades educacionais para que possamos atravessar esse período.

Em termos práticos, a proposta da SEEDUC consiste em disponibilizar para os alunos, através de uma plataforma própria, a Applique-se, conteúdos educacionais, tendo como base o currículo mínimo, na forma de podcasts e vídeoaulas, previamente preparados, segundo a Secretaria, por professores da rede. Da mesma forma, para aqueles alunos sem acesso às tecnologias necessárias, serão disponibilizadas apostilas, também com conteúdos pré-selecionados e estudos dirigidos. De acordo com o programa, caberá então ao professor "o papel de estimular o uso do aplicativo, auxiliando os alunos numa rotina de estudos, de maneira a aproveitar todos os recursos da plataforma". Além disso, continuam com o Google Classroom, como opção de plataforma, na qual os professores poderão postar conteúdos e avaliações complementares, assim como esclarecer dúvidas.

Conforme já exposto, tal proposta não configura um processo de ensino-aprendizagem por não respeitar a autonomia pedagógica do corpo docente das escolas. Ao apresentar conteúdos pré-fabricados, a Secretaria não compreende que o produto do processo de interação é justamente o conhecimento. Fazem o caminho inverso, deixando o professor como mero tutor dos alunos que, por sua vez, têm pouca ou nenhuma participação como sujeitos do processo, o que notoriamente é gatilho para a evasão escolar, um dos maiores problemas enfrentados no Ensino Médio.

Durante o mês de abril, serão realizadas Avaliações Diagnósticas, porém o planejamento enviado pela SEEDUC-RJ não apresenta nitidamente como serão essas avaliações. Tivemos um ano de 2020 atípico e desastroso, com o aprofundamento das desigualdades educacionais, e mais de 70% dos alunos não acessando com regularidade os conteúdos disponibilizados. Além disso, a falta de recursos tecnológicos, que deveriam ser disponibilizados pela Secretaria de Educação, tanto aos alunos, quanto aos educadores, fez com que essa desigualdade de acesso se estendesse aos professores também, que acabaram por oferecer aos seus alunos diferentes níveis de conteúdos em função de suas parcas condições de acesso digital. Os milhões pagos a emissoras de TV e outras soluções não pensadas em conjunto com a categoria, através do SEPE, enquanto seu sindicato próprio, teriam sido suficientes para fornecer esses recursos tecnológicos tão necessários para a construção de uma alternativa minimamente satisfatória ao ensino presencial.

Ressaltamos, assim, que a defesa da autonomia pedagógica das unidades escolares não pode eximir o governo estadual de garantir a melhoria premente das condições de funcionamento das escolas, as quais abarcam tanto a estrutura de funcionamento das unidades, quanto a ampliação do acesso tecnológico virtual, seja por aparelhos, plataformas públicas e internet gratuita de qualidade disponibilizada à comunidade escolar. A autonomia não pode ser compreendida como desresponsabilização de nenhum dos atores do processo, menos ainda do governo, que é o responsável direto pela garantia das condições de trabalho e ensino.

Em 2021 os educadores da rede estadual não poderão mais ser alijados do processo de formulação pedagógica. Reivindicamos, portanto, a autonomia que nos vem sendo expropriada há anos e que nesse cenário pandêmico é o fundamento da formulação de estratégias pedagógicas emergenciais para o contexto da pandemia, tendo o governo estadual e a SEEDUC-RJ a obrigação de garantir as condições tecnológicas e de acesso digital inerentes ao desenvolvimento dessa proposta pedagógica alternativa emergencial exclusiva para o contexto da pandemia.

SEPE RJ